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9/23/2017

Temporal


       Pirai do Sul, é uma cidade do interior do Paraná onde moramos por um tempo durante minha infância, lá abaixo da estação ferroviária, onde tem o campo de futebol. 
       la pelos meus cinco anos e meio, certo dia parece virar noite, encoberto está o céu por nuvens negras. Mesmo assim todos seguem sua rotina normalmente, atentos e apreensivos. Logo se inicia uma chuva, que vem de leve, mas com sons que indicam um temporal. Este logo chega e parece que toda a água do planeta estava lá no alto e agora cai torrencialmente. 
        Minha avó está a rezar, da janela eu vejo meu pai que vai pegar lenha seca para o fogão, ele para e olha a plantação, então entra rápido no paiol onde é guardada a lenha picada, logo ele volta para dentro de casa, onde eu e minha irmã bem pequena estamos com nossa mãe, eu continuo a olhar da janela a chuva. Agora minha mãe nos chama dizendo, é hora de criança ir para a cama, insistimos em ficar na janela a espreitar a chuva mas ela nos leva ao quarto para dormir.
        Cai à noite e a chuva não para, pequeno eu era, mas vem à mente, lembro como se estivesse acontecendo hoje, estou assustado com trovoadas.   
Quando amanhece, já não é um temporal, mas ainda chove sem trégua, em volta da casa é só água, a terra sumiu a plantação de arroz já não se vê. As criações estão presas.
      Nossa, presencio pela primeira vez em minha vida uma enchente, como qualquer criança acho lindo, maravilhosa água que não acaba mais, imagino barcos que não existem, fico imaginando monstros que devem existir com tanta água.
     Saímos para a varanda, falta apenas um degrau para a água adentrar nossa casa, assim as crianças dentro de casa, esperando a água baixar. Já os adultos saem para ver os estragos, pais, tios e vizinhos só no corre-corre para tentar salvar algumas coisas da água.
Finalmente a chuva para, por entre nuvens vem esparsos raios de sol.
A rua em frente virou rio, os poucos carros a passar, parecem barcos a navegar sobre ondas que se formam com sua passagem
     No segundo dia já pela manhã, podemos ver buracos na rua formados pela água, melhorou o tempo então saímos da casa e seguimos caminhando na rua, parece outro mundo, água baixando e deixando a mostra seu trabalho de destruição.
       A plantação já destruída, cerca caída, casas tortas empurradas pela força da água.
Seguimos em direção a ponte todos estão curiosos, querem ver para crer.
       Sim a ponte foi retirada de seu lugar, empurrada vários metros abaixo, e agora parte sobre o barranco do rio e outra quase caindo no leito do mesmo.
      Duas margens tão próximas e ao mesmo tempo tão distantes, pela enorme volta que tem de se caminhar para se chegar ao outro lado.
Para mim novidades a todo instante, sim meu mundo era meu quarto e o terreiro de minha casa, agora estou aqui vendo tanta coisa, meu pequeno cérebro nem consegue absorver tantas novidades de imediato, nem tomo conhecimento de que muitos estão sofrendo com tudo isso.
Mas hora, sou um menino, cinco ou seis anos, mas crescido para a idade.
Para mim é só alegria e brincadeira, correr espirando água umas nas outras, crianças a empurrarem um tronco solto, fazendo de conta que é um barco. Doce infância, quando a inocência prevalece sem maldades, para com outros, nem mesmo sabe se o tratamento que recebe é maldade ou bondade natural de adultos para com criança.
     Agora já podemos ver com clareza, pois no céu veio o sol com todo seu esplendor, calculado devem ser os prejuízos, muitas coisas para serem refeitas.
      E nossas vidas voltarão à rotina, até que novas histórias venham a acontecer.

Pois a vida sempre segue seu curso assim como aquele rio, que passa debaixo da ponte, até hoje caída, a água vai em frente levando tudo que a atrapalha, ao mesmo tempo lavando fazendo uma limpeza no sulco da terra, que forma o leito desse rio que transbordou e tanto estrago proporcionou. Reconstruir, agora só continuar a viver.


(Sergio Quegi – 17/09/2017) 

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